Picolé do Morais

Rio de Janeiro

Quando o português Antônio Morais, camponês da Serra da Estrela, abriu as portas de seu armazém em Ipanema, havia menos de 100 anos que ali se pescavam baleias. Em 1936, o bonde ainda circulava pela Rua Visconde de Pirajá. Adriano, o filho mais velho de Antônio e Maria, tinha apenas quatro anos, mas conhece bem essa história.No início, o empreendimento do pai era uma espécie de vendinha, cujas prateleiras exibiam doces, frutas, compotas, vinhos. “Junto com os alimentos papai tinha uma pequena sorveteria. E a mamãe começou a fazer sorvete”, conta Adriano, que hoje empurra o carrinho de picolé Morais pelas ruas e praias do Leblon e Ipanema. Os sabores eram comuns, chocolate, flocos, creme, até que Dona Maria decidiu inovar. “Um dia ela acordou não sei se de bom ou mau humor e disse: ‘Não faço mais isso, agora só sorvete de frutas’”. Jabuticaba, abacate, tangerina, caju, jaca, abacaxi, banana, fruta para ninguém botar defeito. A novidade agradou e o lugar ganhou o nome de Sorveteria das Crianças.Adriano comprou a sorveteria do pai em 1955 e a manteve até 1980. Na Ipanema do Bar Veloso, do Posto Nove, do Pasquim, os Morais viram nascer a bossa nova, o surfe no Arpoador, a Banda, o frescobol, o biquíni fio dental. Depois de tantos anos, é natural que Adriano não passe um dia de trabalho sem reencontrar um velho cliente. “Diariamente vem alguém me dizer que se lembra do velho sorvete. E tem sempre aquele cara que diz: ‘Morro de saudades do teu picolé de coco queimado’. O problema é que nunca fiz picolé de coco queimado!”

Fotos: Marcos Pinto/ Texto: Ines Garçoni